lundi 12 octobre 2009

A Espera





(fotografia: Juliana Gelmini)

carta à Saudade



Mas não desisti da história que vai fazer com que minha saudade passe.

Achei que seria fácil encontrar minha saudade em Totó: aquele jogo que tem nome de cachorro, mas não late nem tem o amor que os cachorros nos dedicam. Eu gosto de explicar coisas óbvias às pessoas, é como se elas pudessem redescobrir o mundo que já acreditam descoberto...

Se eu ainda falasse com meu amigo Diego e não tivesse apenas dele a saudade, eu queria dividir com ele a luz que cobria minha cortina ontem. Ela ficava se suspendendo entre um olhar meu e outro para brincar comigo e me fazer pensar que já tinha escurecido quando, na verdade, não tinha, era apenas a posição que ela fazia no pedaço do telhado.
As luzes são seres muito brincalhões como eu pude perceber.

Iria contar para ele também tudo que ouvi ontem andando na praia.
Às vezes, andando, esbarro com o Destino. Foi assim que aconteceu ontem, encontrei o Destino, pois vi nitidamente: eu e o Diego sentados no murinho da praia que íamos sempre e que eu estava. É claro que na lembrança-lembrança mesmo não tem murinho, não tem nada além do cheiro dele, da boca dele e do amor que eu sentia ali naquele momento, mas o Destino, dessa vez, escolheu que eu visse como se fosse filme reprisado, ali na minha frente, eu no colo dele olhando o mar...

Foi bonito e, por um instante, tentei entrar na reprise, tentei, me joguei para dentro dela, mas o Destino segurou em minhas mãos, sorriu um sorriso de Destino e, de repente, tudo sumiu... até hoje eu fico tentando entender sorrisos de Destino. Depois eu esqueço de pensar sobre isso e, as vezes, lembro e quando lembro invento uma história também para isso, mas todas as minhas histórias são verdadeiras, deixo isso bem claro, porque quando invento elas acontecessem todas no mesmo instante em que invento! É verdade e eu posso provar para vocês.

Vocês não acham que essa lembrança que o Destino me mostrou é bonita?

Se vocês soubessem o quão quente ela é, gostariam de todo dia, pedir pro Destino para revê-la mas rever junto, porque rever sozinha é muito triste. Por isso,vou mudar de assunto.
Eu disse que eu podia provar que tudo o que eu invento é verdade porque eu só pude sentir a minha saudade do Diego porque inventei a minha história com ele e a minha invenção foi acontecendo assim, na mesma hora que eu a escrevia na minha cabeça.
Tentem fazer isso e depois me contem se também aconteceu com vocês, acredito que sim porque o Destino com toda a sua falta de democracia, também é sensível e nos cede algum controle sobre nosso Presente e o torna presente para nós.
Vocês devem estar se perguntando "então, por que eu inventei uma saudade?"

Vou explicar, eu não sei mais porque as estórias que eu escrevia sonhando na minha cabeça não se tornaram mais histórias e o Diego se tornou saudade. Acho que é porque para que uma estória que eu sonhe se torne história era preciso que o Diego também sonhasse a mesma estória e, só ai que o Destino aparecia e deixava ser história.
Quero pedir um favor a vocês, se vocês encontrarem o Diego, perguntem para ele se ele não sente saudade de sonhar as mesmas estórias que eu.
Façam isso quando puderem, mesmo que escrevendo o encontro por pensamento! Vai que algum pensamento encontra o dele e o Destino aparece e deixa o pensamento virar real?
beijos,

Juliana


(fotografia:Juliana Gelmini)

lundi 28 septembre 2009



Tanta luz e medo de qualquer sopro de espanto

dilua à forma outra

que não flutue...


Minha bolha flutua

reflete fotografias de tons

aqueles que deságuam dos cílios

pára-quedistas no ar.



 
Juliana Gelmini

(fotografia: autor desconhecido)

lundi 27 juillet 2009



Por isso, ela crescia para dentro.


Dizia que: “ tudo o que não invento é falso”(in Manoel de barros)

Chovia.
Passos se estreitavam.
Vistos do céu: guarda-chuvas desenhavam estrelas do mar.

Parou.
Suas pernas não queriam mais continuar. Seu corpo cansado de ser passivo,agora ordenava.
Dançou impulsivamente na chuva em meio à multidão ensurdecida de si mesma.
Seu corpo sabia como vesti-la de vida.
Debruçou seus olhos diante a poça que se formara: transbordou-a num chão de oceano por onde deslizava e, em desespero, pensava nos desejos que em sua pele coagularam, mofados de tanto esperar.

A tirania do seu corpo ordenava sua alma-nua. Com a nudez de sua alma: o mundo se liquefez e entornou cores sem formas que só se constituíam nítidas sob a perspectiva do sentir. O que pulsava,desenhava-se de contornos. E neste dia, do embaçado de tons amarelos,nos olhos dele se refletiu,olhar dentro do outro olhar,espelhos.

Relevo coberto dos sons de suas palavras: ele se fez nítido e suas mãos as dela se davam por todas as ruas.
-teu amor me chegou num dia morno,devorou-me e então, percebi: te amava.

A multidão, passos entre os outros passos que passavam, borrão de cores e sons,insípidos e inodoros pois não os pertencia. Os traços se desenhavam nas linhas de suas retinas, ruas de lembranças.

Um dia, ele, líquido,entornou-se em retinas comuns, desfeitas nas cores da multidão.

Do céu: guarda-chuvas desenhavam escudos contra o cinza-morte que o vento esvoaçava de tudo.
E em saudade, ela dissolveu-se.

Juliana Gelmini


(Pintura: autor desconhecido)

samedi 25 juillet 2009

sapatilhas de lã

Hoje acordei e minhas mãos estavam menores, vestia um pijama com estampa de Julieta e era amarelo- pensava em como achava mais bonito esse nome do que Juliana . Era julho e eu vestia sapatilhas de lã de uma cor forte- cor de coração de vó- várias coisas no mundo possuem esse cor, almoço de domingo, olhar de incentivo, e eu tinha essa cor nas sapatilhas de lã do inverno. Hoje vestida nelas, achei que poderia deslizar pela casa toda ou por todo o céu inventado- coisa secreta - mas com eles nos pés, enxergando tão nitida aquela cor, chorei. Como se ela  pudesse, de alguma forma, me colocar no colo e enrolar meus cabelos em seus dedos enquanto o restodo mundo ia desaparecendo...




Para a minha Vó.

jeudi 26 mars 2009




Cotidiano

A menina se balança na rede da varanda:
pêndulo do tempo suspenso no agora.
Encerrada entre papéis, uma borboleta morta:
sepulcro da metamorfose.
Flutuo como o que subitamente tomba.
A luz morna da finitude do sol percorre o canto dos meus lábios
como um beijo antes da morte do hoje.
o castanho-multidão que me despe da existência física
e me dissolve em poesia

Juliana Gelmini



(fotografia: Juliana Gelmini)