samedi 31 octobre 2015

Palavrar a brincar

Palavras que sonham, 
de trem,  a alguém, 
gota d´ água, 
demármore,
palavras pedras,
cuspidas,
mastigadas,
 a quem?
palavra demorada,
areia derramada,
palavra queimada, ai!

Palavra lá a apontar,
crescer, atirar, 
acariciar a 
palavra horizonte,
palavra embrulhada 
presente, azul,
de tão, de vão, arpão, 
dequem?, 
palavra sim, plim! 
e não,
palavrão!

Palavra com memórias,
novelo de histórias,
baile de máscaras,
nos olhos araras,
talvez com guarda-horas,
cheiro do agora,
raiz redonda da asa,
certidão de nascimento inventada,
a palavra janela,
setembro, imenso, inteiro,
palavras compostas
astronauta-teu-beijo,
corda-bamba, 
três-queijos, 
batata-quente,
risos-berinjela.



Palavra velha,
tagarela,
desempre,
como era?
a palavra entrega, 
pisca-pisca  na
palavra retrovisor,
depois, atrás,
invertida,distorcida,
parede descascada,
palavra que não lembro mais.

Palavras que acordam,
fazem cócegas,
mais o quê?
riscam estrelas,
explodem planetas,
palavras calabouços,
palavras mas,
as adversativas, 
entretanto,porém,todavia,
toda a vida,
trancafiadas, 
identidade rasgada,
arranhadas,
aranhas que riscam voos, 
palavras bêbadas,
bem-humoradas 
palavra vrum, pum,
lugar-comum,
palavra palavra
com versinhos,
com versão, 
a palavra verão a secar,
a ventar sem rimas

Palavras de subversão, 
a lutar
váriasvozescoladasemuma

Ou  palavras sorvete de manga
[com pimenta]
palavras molhadas
a pingar tua risada
palavras para deitar em
dias-nuvens a ser mar, 
palavra neblinha,
palavrinhas, 
passarinhas,
palavra agora,
palavrupts, 
palacrash,
palavrazum,
corazon, sino, rosa,
palavra que beija o que toca,
palavra tãn, 
palavramar, 
intransitiva, 
palavras não ditas,
riscadas,
esquecidas,
engolidas,
esparadrapadas,
dopadas,
palavra livro
a desassossegar ,
livres a entrar
na palavra vida
entre porta e poesia,
carta, utopia, vírgulas,
saudade no chalé, 
café na pequena xícara
do "amar é..." 
a palavra tulipa
vestida para festa,
a palavra querer,
palavra para ser, 
palavra para incorporar, 
ah, palavrar a brincar!



[agora é sua vez!]





vendredi 16 octobre 2015

Não entre.

Você que mora no futuro
debruçado na janela
movediça da minha vida
do antes
do vício do cio de cicatriz por um fio,
não entre.

Você em branco, breu, nada, 
sem importância, passante na multidão da Cinelândia ou Presidente Vargas, vaga 
porvir 
num mapa de apenas [até hoje] uma grande e longa rua com um só nome
nome não teu,
não entre.

você preso no espaço do antes,
você que me olha, às vezes, da tela
movediça do tempo que sonha
[vela acesa]
e pisoteia o pouco silêncio do sótão,
Não entre.


você sem rosto entre tantos
você que talvez eu irei num dia
[ em tesão do ainda]
amar [verdadeiramente]
trocar livros e longos telefonemas
cheiros, vontades, cinemas
músicas e cartas mais bonitas 
medos e segredos da infância
[um urso que se chama Melvin]
cheiro de mel, beijo nos olhos,
mãos dadas, melhores amigos
um dia teu "namora comigo?",
não entre.

Você que um dia cansado do amor
acordou entre um enjoo e outro
depois de me apaixonar
a faca enfia [manso como um psicopata]
nas palavras
do antes,agora ontem
a incendiar
Mais um copo de vinho ou de chopp
entre noites que  você não veio
meu mas acordado
a escrever cartas de madrugada [rasgadas]
a enfeitar a porra da espera com argumentos fracos
a paixão no arpão do teu desleixo
você sempre ocupado, "depois eu falo",
de repente meu nome como uma palavra que pesa e confunde
riscado como se nunca existisse
você que mentiu, me iludiu, babaca egoísta
você não sabe o desfecho do hoje:
à noite, do  mais alto prédio de São Paulo,
no céu cinema, enceno Ofélia num rio
me atiro [louca e sem sentido] no teu risco.
Não entre.
Não entre.
Não entre.




mardi 6 octobre 2015

6 de outubro - livre arbítrio

A cura  encontra meus olhos
na maca de uma casa de luz
Lençóis brancos, alma sincera
A prece como uma rosa aberta
entre meus dedos expurga medos
[cautelosamente e sem ruídos]
Entregue às energias elevadas
vindas de mãos ao bem devotadas,
em gratidão, me entrego virtuoso à
busca de um coração mais generoso!
[Você vem?]



Rua sem saída

Na última casa do final da rua sem saída
[seria uma metáfora da minha vida?]
meu portão verde mais parece ironia

Da casa da frente, a roseira vermelha espia
um navio entra por engano na avenida
e ancora teu nome de frente para a utopia
[perto da minha janela]

A palavra ancorada pesa como um prédio
Balança a minha casa como num mar aberto
Estilhaça as vidraças com vista para o aperto

 A falta derrete na boca como uma mesa






Sala de espera

Uma criança  balança
pernas no alto da cadeira
purpurinas na trança

Na sessão da tarde,
uma personagem dublada
sem mexer a boca, rápido fala

A ansiedade sentada na minha cabeça
Toma meus dedos à força
e enrola sem parar meu cabelo
perto da raiz, do lado esquerdo.


Duas e meia da tarde sem livro ou sol
Dentro de um prédio comercial
Esperando a otorrinolaringologista
Na Rua República Árabe da Síria



[Uso interno - palavra otorrinolaringologista:
pronuncie devagar, assobiando as letras
uma vez à noite na direção do mar
entre a linha que reparte as dúvidas e as peras]





Trança



Tranço o desejo de selvagens fios
Domo seus cascos e relinchos grossos
contra minhas mãos machucadas

Divido o desejo em três: olhos, garras, seixos
puxo-os estreitamente rente aos vermelhos
estico cheiros entre  xícaras e medos

Os olhos trançados sobre os seixos em sexo
As garras trançadas entre seus grasnidos
Orgia de orgasmos trançados e contidos.

Na ponta da trança, a palavra "não" enlaça
teu nome como uma fivela de papel

Afundo a trança domada num aquário de pano retangular
Para quando encharcada, arisca e tonta
Possa colocá-la ao sol para da sede secar












lundi 5 octobre 2015

5 de outubro - anoitecer

Mesa da sala, roseira  e bilhete
Um avião entre Porte Alegre - Rio
Praia da Bica, debaixo d'água,
alguém lê um livro
sobre piratas, sereias e paixões
Aeroportos voam dos chãos
Lambuzo uma manga limpa
Adamastor se petrifica sem sua ninfa
O Tempo toma chá frio e sem açúcar comigo
[Chove fininho]
Uma garça enfeita o telhado do vizinho
Pelas ruas, vou de trança e vestido xadrez
Não lembro mais de você.



5 de outubro

À noite, andei quilômetros para
encontrar uma padaria acordada
com torta ou bolo de infância
(daqueles doces muito doces
que disputo com as formigas)
Comi só o recheio enquanto
a repórter dentro da 'tevê' dizia:
"Cientistas japoneses descobrem
cada pessoa é única por sua forma de andar"
Um gato passou na esquina vazia 

 Não lembrei do seu olhar.